sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Desabafo encontrado num livro de Clarice Lispector - Autora anônima

Na semana passada, mais precisamente no dia 19/08/2009, peguei emprestado da Biblioteca da UnB (Universidade de Brasília) um livro da Clarice Lispector, "A maçã no escuro", que continha uma folha de papel dobrada duas vezes e nela continha este desabafo, sem assinatura ou qualquer pista para reconhecimento, que aqui transcrevo:


" A sensação é a de estar no lugar errado e com as pessoas erradas constantemente. Parece que eu fui jogada aonde não deveria estar, com pessoas que não pensam/ agem como acho que poderia ser (e isso existe?)
O que é que eu tô fazendo nessa porra de mundo com pessoas tão estranhas? Por que é que apesar de tudo eu gosto delas? Como é que mesmo achando tanto erro e tanta solidão eu continuo assim? Há uma maneira de fazer/ser o que eu acredito?
Eu só queria viver imersa no que eu acredito ser bom, naquilo que me fosse satisfatório. Mas não vejo meios de sair de onde estou, não sei como começar.
Eu sei que uma mudança de cidade não seria a resolução dos meus problemas, mas em lugar desconhecido, cheio de gente nova seria mais fácil de recomeçar. Decidir ser o que e quem eu quisesse. Ir até onde eu conseguisse.
Eu sou uma farsa, uma fraude. O que acham que eu sou não é verdade. O que acho que sou não é verdade. Eu preciso urgentemente me encontrar, definir cores e gostos e cheiros e roupas e pessoas. Ou não definir nada. Deixar as coisas irem e vejo se gosto e se gostar acompanho. Eu preciso de um tempo só, sem ver ninguém, nem falar com ninguém. Eu não quero mais opiniões. Eu não quero dizer mais nada. Eu não estou com vontade de sorrir, mas minha vida anda tão no automático que o sorriso sai sem pensar no porque. Eu cansei de todas as minhas ilusões bobas e infantis. Eu cansei de acreditar. Eu não entendo porque insisto nisso. Eu tô precisando chorar de soluçar.
Eu quero outra vida. Eu quero ser outra pessoa que não eu. Eu tô cansada das crises de sempre. De mim. Dos outros. De tudo.
Eu só queria me encontrar. Ir pro lugar certo, aprender e sentir.
Tá tudo tão engasgado que eu já nem sei porque exatamente eu choro."